sábado, 22 de julho de 2017

OS TRÊS DIAS DO DIABO


     
OS TRÊS DIAS DO DIABO
de Josué da Silva
Edição: N.A. Orion
Ano: 1976
152 páginas
Narrativas sobe o 25 de Novembro.
Livro em bom estado. 
Capa ligeiramente oxidada. Páginas limpas, sem anotações
PREÇO 9.€00

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 UM RETRATO DE PORTUGAL NA ÉPOCA

    Sobre o tema:


 
O levantamento militar de 25 de Abril de 1974, conhecido pela Revolução dos Cravos, teve
como objectivo principal a implantação em Portugal de um regime democrático, pondo fim a 48 anos de ditadura, proporcionando uma solução política imediata para a guerra colonial. A definição desse regime não foi consensual entre as diversas facções partidárias e movimentos sociais e políticos que surgiram então. Com a adesão espontânea de grande parte da população das principais cidades do País, o Golpe de Estado transformou-se em processo revolucionário (PREC). Na noite de 25 de Abril de 1974 o MFA deu a conhecer à população portuguesa o seu Programa político e militar, o qual comportava diversas medidas de carácter político, jurídico, social e económico. O Programa do MFA não apontava para qualquer tipo específico de regime democrático mas, em contrapartida, no seu ponto 6 apontava para uma reorganização e social do País de tipo socialista (ou no mínimo socializante), antimonopolista e favorável às classes e camadas sociais mais desfavorecidas. Foi sobretudo a favor ou contra estas provisões do Programa do MFA que a luta política, social, ideológica, económica e militar - a luta de classes - se iria desencadear. Esse debate ideológico entre ainda permanece, nos moldes da democracia portuguesa, ao nível de historiadores, politólogos, especialistas de relações internacionais ou elementos da classe política.
As forças mais identificadas com o modelo económico e social, comummente definidas de economia de mercado, de livre iniciativa, ou capitalista, considerando os respetivos conceitos da Ciência Política, como o PS, o PPD, o CDS, o PPM e as fações militares suas aliadas (spinolistas, direita militar mais conservadora, melo-antunistas, moderados mais ou menos aliados à ala direita do PS, como os soaristas) iriam tudo fazer para inviabilizar a implementação do ponto 6 a) e b) do Programa do MFA. Aliar-se-iam inclusive a potências estrangeiras e as respetivas agências de espionagem (EUA, RU/GB, RFA).
Algumas forças mantiveram-se fiéis ao referido PREC, acrónimo para Processo Revolucionário em Curso, nomeadamente as forças políticas da esquerda parlamentar e constitucional, formada pelo MDP/CDE - Movimento Democrático Português - Comissão Democrática Eleitoral e a UDP União Democrática Popular e de vez em quando aliadas ao PCP - Partido Comunista Português. Constituíam o que se chamou Frente de Unidade Revolucionária e todas visavam a implantação de uma república popular. Todas elas detinham, em conjunto com o PCP, 36 dos 250 Deputados Constituintes.
Por oposição outras facções mais moderadas que um ano depois, em 1975, detinham uma ampla maioria dentro da Assembleia Constituinte, (214 dos 250 Deputados Constituintes), constituída por PS - Partido Socialista, PPD - Partido Popular Democrático e CDS - Centro Democrático Social, defendem a implantação de uma Democracia constitucional de cariz semi-presidencialista.

Antecedentes

A 25 de Abril de 1975 decorreram as eleições para a Assembleia Constituinte. O Partido Socialista vence as eleições, as primeiras eleições livres dos últimos 50 anos e com uma participação eleitoral excepcional e sem incidentes de maior, dando a este 38% e 116 eleitos, o Partido Popular Democrático obtém 26,5% e 81 eleitos, o Partido Comunista Português obtém 12,5% e 30 eleitos, o Centro Democrático Social obtêm 7,6% e e 16 eleitos, MDP/CDE - Movimento Democrático Português - Comissão Democrática Eleitoral obtêm 4,14% e 5 eleitos, UDP União Democrática Popular obtém 0,79% e 1 eleito e a Associação para a Defesa dos Interesses de Macau (ADIM; representava os interesses de Macau e estava conotada com o CDS) obtém 0,3% e 1 eleito.
A 21 de Junho, Otelo Saraiva de Carvalho, à data detentor do comando do COPCON, juntamente com o capitão Marques Júnior, à data membro do Conselho da Revolução, iniciaram uma visita de 10 dias a Cuba. A viagem foi realizada a pedido do Partido Comunista Português e apoiada pelo comunismo internacional, e tinha com o intuito atrair Otelo para o seu lado e assim garantir o controle do poder militar por parte dos comunistas.[3]
A 11 de Novembro, uma manifestação de trabalhadores da construção civil cerca a Assembleia Constituinte, impedindo a saída dos deputados constituintes e do Primeiro-Ministro do Palácio de S. Bento, após 36 horas. No dia 13 de Novembro o almirante Pinheiro de Azevedo é obrigado a ceder às reivindicações dos operários que exigiam aumentos salariais.
Em 16 de Novembro é realizada uma manifestação de trabalhadores da cintura industrial de Lisboa e das Unidades Colectivas de Produção alentejanas no Terreiro do Paço, em Lisboa, de apoio ao "Poder Popular", nesse dia vários dirigentes e deputados do PS, PPD e CDS estão no Porto, correndo rumores que a Assembleia Constituinte pode vir a ser transferida para aquela cidade.
A 20 de Novembro o VI Governo Provisório auto-suspende-se enquanto não lhe forem dadas garantias para poder governar, nesse dia é realizada uma manifestação em frente ao Palácio de Belém a favor do "Poder Popular", Costa Gomes fala com os manifestantes, afirmando ser indispensável evitar uma guerra civil.
No dia 21 de Novembro, o Conselho da Revolução destitui o general Otelo Saraiva de Carvalho do comando da Região Militar de Lisboa e substitui-o pelo capitão Vasco Lourenço ligado à linha moderada, dois dias depois é realizado em Lisboa um comício do PS, em apoio ao VI Governo Provisório, na Alameda D. Afonso Henriques, o mesmo conta com milhares de pessoas. No dia seguinte em 24 de Novembro, os populares de Rio Maior[4] e os agricultores associados da CAP (Confederação dos Agricultores de Portugal), na altura conotados com a direita tradicional e patriótica, cortam as estradas de acesso a Lisboa, separando o Norte de Portugal e o Sul.

Golpe Militar de 25 de Novembro

No dia 25 de Novembro

Na sequência de uma decisão do coronel piloto-aviador José Morais da Silva, Chefe do Estado-Maior da Força Aérea,[5] que dias antes tinha mandado passar à disponibilidade cerca de 1000 camaradas de armas de Tancos, paraquedista da Base Escola de Tancos ocupam o Comando da Região Aérea de Monsanto, Escola Militar da Força Aérea e mais cinco bases aéreas e detêm o tenente-coronel Aníbal Pinho Freire e exigem a demissão de Morais da Silva.
Este atos são considerados pelos militares ligados ao Grupo dos Nove como o indício de que poderia estar em preparação um golpe de estado vindo de sectores mais radicais, da esquerda. Esses militares apoiados pelos partidos políticos moderados como o PS e o PPD e depois do Presidente da República, General Francisco da Costa Gomes ter obtido por parte do PCP a confirmação de que não convocaria os seus militantes e apoiantes para qualquer acção de rua, decidem então intervir militarmente para controlar o país.
O Regimento de Artilharia de Lisboa (RALIS), conotado com a Esquerda Militar, toma posições no aeroporto de Lisboa, portagem de Lisboa A1 e Depósito de Material de Guerra de Beirolas; e forças da Escola Prática de Administração Militar ocupam a RTP e a PM controla a Emissora Nacional, as duas Unidades militares eram conotados respectivamente com a esquerda revolucionária e com a referida Esquerda Militar ('gonçalvistas') e com a Esquerda Militar Radical ('otelistas').
O Regimento de Comandos da Amadora, conotada com os moderados, com a Direita Militar ('spinolistas' e outros sectores conservadores e ultra-conservadores militares, e identificados com os partidos da Direita política parlamentar, a Igreja e sectores da Extrema-Direita) e com o Centro Militar ('melo-antunistas' ou 'moderados', identificados com o PS e o 'grupo do Florida'), cerca o Emissor de Monsanto, ocupado pelos Paraquedistas, e a emissão da RTP é transferida para o Porto.
Mário Soares, Jorge Campinos e Mário Sottomayor Cardia, da Comissão Permanente do PS, no seguimento de um plano contra-revolucionário previamente estabelecido, saem clandestinamente de Lisboa, na tarde do dia 25, e seguem para o Porto, onde se apresentam ao moderado Pires Veloso no Quartel da Região Militar Norte, através do General piloto-aviador José Lemos Ferreira que teria oferecido resistência ao seu comandante o brigadeiro graduado Eurico de Deus Corvacho;
O Presidente da República decreta o estado de sitio na área da Região Militar de Lisboa, e teve um papel determinante na contenção dos extremos. O Tenente-coronel António Ramalho Eanes, adjunto de Vasco Lourenço e futuro presidente da republica, ilude pressões dos militares da extrema-direita que o incitam a mandar bombardear unidades.
Vasco Lourenço dá voz de prisão a Diniz de Almeida, Campos Andrada, Cuco Rosa e Mário Tomé, todos militares conotados forças políticas de esquerda revolucionária, sendo o último inclusivamente filiado na UDP; diversos Oficiais ditos 'moderados' estavam então conotados com o PS (com o qual conspiraram na preparação do plano e das operações que desembocaram no '25 de Novembro de 1975') e o PPD.
Posteriormente o "Grupo dos Nove", vanguarda de todas as forças políticas e militares do Centro e da Direita (parlamentar e extra-parlamentar) e os seus aliados, alcançam o controlo da situação.

No dia 26 de Novembro

Jaime Neves, e uma unidade por si dirigida dos Comandos da Amadora, ligados aos moderados, atacam o Regimento da Polícia Militar da Ajuda, unidade militar tida como próxima das forças políticas de esquerda revolucionária. Após a rendição, o resultado são três mortos, tendo posteriormente os militares revoltosos sido presos. As forças das Regiões Militares do Norte e Centro deslocam-se para Lisboa, e Melo Antunes declara na RTP que o PCP "é indispensável à democracia", afastando as veleidades da direita saudosista, que apesar de ter um plano de tomada de poder, se colou ao Grupo dos Nove.

No dia 27 de Novembro

Os Generais Carlos Fabião e Otelo Saraiva de Carvalho são destituídos, respectivamente, dos cargos de Chefe de Estado Maior do Exército e de Comandante do COPCON. Ramalho Eanes é nomeado Chefe de Estado Maior do Exército em substituição de Carlos Fabião e graduado em General. O COPCON é integrado no Estado Maior Geral das Forças Armadas. Por decisão do Conselho de Ministros a Rádio Renascença é devolvida à Igreja Católica. São enviadas para a prisão de Custóias algumas dezenas de militares detidos na sequência dos acontecimentos do 25 de Novembro, sendo que Costa Gomes, Presidente da República, decreta o estado de sítio parcial na região abrangida pela Região Militar de Lisboa.

Acalmia

A 28 de Novembro, o VI Governo Provisório retoma as suas funções e é suspensa a publicação dos jornais estatizados, no dia seguinte em conferência de imprensa, Sá Carneiro acusa o PCP de ser responsável pela insubordinação militar verificada, o PS tem idêntica atitude.
É levantado o estado de sítio em Lisboa a 2 de Dezembro, no dia seguinte a Assembleia Constituinte PS, PPD e CDS acusam o PCP de estar envolvido nos acontecimentos de 25 de Novembro.
Em conferência de imprensa, a 4 de Dezembro, Mário Soares acusa o PCP de ter participado activamente no 25 de Novembro, utilizando a extrema-esquerda como ponta-de-lança e critica o PPD por "anti-comunismo retrógrado" ao pretender o afastamento do PCP, como condição da sua permanência no Governo, nesse mesmo dia o PS a par do PPD e CDS defendem a revisão do "Pacto MFA-Partidos".
O PCP realiza, em 7 de Dezembro, um comício no Campo Pequeno, Álvaro Cunhal reconhece a derrota sofrida pela esquerda revolucionária, e apela à "unidade das forças interessadas na salvaguarda das liberdades, da democracia e da revolução".
A 1 de Janeiro de 1976 a GNR intervém, junto à prisão de Custóias, para dispersar a manifestação de solidariedade com os militares presos após o 25 de Novembro de que resultam quatro mortos e seis feridos [8]É preso, em 19 de Janeiro, Otelo Saraiva de Carvalho após a divulgação do Relatório Preliminar dos acontecimentos de 25 de Novembro, alegadamente este estaria implicado no possível golpe militar de esquerda.
É realizada uma grande manifestação popular, no dia 20 de Fevereiro, em Lisboa pela libertação dos militares presos em consequência dos acontecimentos de 25 de Novembro.
No dia 3 de Março de 1976, Otelo Saraiva de Carvalho, é libertado e passa ao regime de residência fixa.
Fonte Wikipédia 













Outras visões da História


Sobre o 25 de Novembro de 1975

por António José Rodrigues
Os acontecimentos de 25 de Novembro de 1975 surgem na sequência do chamado «verão quente», da queda do V Governo Provisório e do afastamento do general Vasco Gonçalves dos cargos e estruturas superiores das Forças Armadas e do Movimento das Forças Armadas (MFA), objectivo há muito perseguido pelas forças de direita e da social-democracia, sob a batuta da direcção do PS, do Grupo dos Nove e de sectores esquerdistas agrupados em torno de Otelo Saraiva de Carvalho, ao mesmo tempo que com a política de saneamentos à esquerda a Esquerda militar perdia posições importantes nos centros de decisão político-militar.
Os acontecimentos de 25 de Novembro de 1975 surgem na sequência do chamado «verão quente», da queda do V Governo Provisório e do afastamento do general Vasco Gonçalves dos cargos e estruturas superiores das Forças Armadas e do Movimento das Forças Armadas (MFA), objectivo há muito perseguido pelas forças de direita e da social-democracia, sob a batuta da direcção do PS, do Grupo dos Nove e de sectores esquerdistas agrupados em torno de Otelo Saraiva de Carvalho, ao mesmo tempo que com a política de saneamentos à esquerda a Esquerda militar perdia posições importantes nos centros de decisão político-militar.
O agravamento da crise político-militar e a ofensiva contra-revolucionária correm em paralelo, com lugar de destaque para o terrorismo bombista, que conta com a activa participação de militares e políticos e onde se destacam organizações como o MDLP-Movimento Democrático de Libertação de Portugal, inspirado e chefiado por Spínola, e o ELP-Exército de Libertação de Portugal. Organizações terroristas, contra-revolucionárias e anti-comunistas, que actuavam a partir do estrangeiro, nomeadamente do Brasil e da Espanha.
Uma crise que se agrava também à medida que se aproxima a data da independência de Angola, a 11 de Novembro. O processo de descolonização surge também na primeira linha da luta política em Portugal entre as forças revolucionárias e as contra-revolucionárias que, neste caso concreto, procuram impedir a concretização da independência na data aprazada e a consequente transferência do poder para um governo do MPLA. Uma batalha que perderam, conseguindo no entanto, com o empenhamento de Mário Soares e de Sá Carneiro, impedir que o Governo português reconhecesse no momento próprio (o que só aconteceria meses depois) a independência de Angola e o seu governo. Aliás, o PCP foi o único partido presente no acto de independência. Tudo isto, na expectativa que as tropas que invadiram Angola, a partir da África do Sul e do Zaire, conseguissem entrar em Luanda a tempo de impedir a proclamação da independência.
O 25 de Novembro, ao contrário do que muitos dos seus protagonistas disseram e escreveram e alguns continuam a insinuar, não foi um golpe promovido pelo PCP, pela Esquerda militar ou pela «ala gonçalvista» do MFA mas sim um golpe militar contra-revolucionário, fruto de uma cuidada e longa preparação, no quadro de um tumultuoso processo de rearrumação de forças no plano político e militar. É isso, aliás, que nos relata uma figura destacada da conspiração, José Gomes Mota, em A Resistência. O verão quente de 1975: «Para a elaboração desse plano criaram-se, inicialmente, dois grupos de trabalho, um político e outro militar, definindo-se-lhes prioritariamente as seguintes tarefas:
O grupo político, constituído basicamente pelos Conselheiros da Revolução teria de definir as acções a empreender pelo Movimento a todos os níveis dos órgãos de associativismo militar, com especial relevo para o Conselho da Revolução, Assembleias do MFA e Assembleias dos ramos e articular a sua acção, sem hipotecas ou comprometimentos, com a dos partidos que “guerreavam” aberta e energicamente os dissidentes.
O grupo militar, inicialmente constituído por Ramalho Eanes, Garcia dos Santos, Vasco Rocha Vieira, Loureiro dos Santos, Tomé Pinto e José Manuel Barroso tinha como tarefas fundamentais a eficiência da componente militar do Movimento e a elaboração de um plano de operações para o caso de qualquer confronto armado com os dissidentes.»
Como refere ainda o mesmo autor, o grupo político «veio a desempenhar o papel de um verdadeiro estado-maior de Vasco Lourenço», que era, de facto, o líder do Movimento, enquanto Ramalho Eanes liderava o grupo militar e se assumia como comandante operacional do Movimento.
Na preparação do golpe participaram forças muito diversas associadas num complexo processo de alianças contraditórias mas unidas em torno de um objectivo comum, como sublinha Álvaro Cunhal em A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril (A contra-revolução confessa-se) : «Todas estavam aliadas para pôr fim à influência do PCP e ao processo revolucionário, restabelecer uma hierarquia e disciplina nas forças armadas e extinguir o MFA insanavelmente em vias de destruição pelas suas divisões e confrontos internos. Mas, como resultado do golpe relativamente ao poder político e às medidas concretas a tomar, havia importantes diferenças.
Na grande aliança contra-revolucionária, internamente muito fragmentada, participavam fascistas declarados e outros reaccionários radicais, que visavam a instauração de uma nova ditadura, que tomasse violentas medidas de repressão, nomeadamente a ilegalização e destruição do PCP. Participava também o Grupo dos Nove, de que alguns membros, receosos da possibilidade de saírem vitoriosas do golpe as forças mais reaccionárias, pretendiam a continuação do regime democrático».
Uma aliança contra-revolucionária que contou com o importante contributo de Mário Soares e do PS. Por seu lado, o PCP teve uma acção incansável, expressa em intervenções do seu Secretário-geral, comunicados da Comissão Política e em variados documentos incluindo no próprio jornal «Avante!», no sentido de uma saída política para a crise propondo e concretizando encontros com todos os sectores, do PS (que recusou) aos agrupamentos esquerdistas, da Esquerda militar ao Grupo dos Nove e a militares esquerdistas ligados ao COPCON, embora sem resultados práticos.
«Em Outubro, quando se tornou evidente, por um lado, que se preparava um golpe militar contra-revolucionário, e, por outro lado, que se multiplicavam divisões, conflitos, fracturas, rupturas, revoltas e insubordinações nas forças armadas, o PCP intensificou a sua acção em quatro direcções.
Primeira, insistindo, em declarações públicas e na sua actividade, na necessidade de uma solução política.
Segunda, insistindo também em que qualquer tentativa da Esquerda ou de esquerdistas de um confronto e de uma solução militar seria, na correlação de forças existente, uma aventura condenada à derrota e podendo conduzir a uma feroz repressão.
Terceira, multiplicando os contactos com os diversos sectores militares e políticos com vistas a uma solução comummente acordada a fim de impedir que, de um golpe militar, resultasse uma ditadura da extrema direita, o que se tornava um perigo real pela composição da “grande aliança” que estava preparando o golpe.
A quarta, continuando a desenvolver as acções de massas.» [Álvaro Cunhal – A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril (A contra-revolução confessa-se)] .
O golpe do 25 de Novembro significou a criação de uma nova situação política, uma viragem à direita na vida nacional, mas os mais ambiciosos objectivos contra-revolucionários foram derrotados. A poderosa dinâmica do movimento operário e popular e o prestígio e intervenção esclarecida do Partido foram factores determinantes para a contenção do golpe. Em lugar de reprimido e ilegalizado, o PCP continuou no Governo e a reforçar-se no plano orgânico e da sua influência social e política. Será com a formação do primeiro governo constitucional do PS sozinho mas de facto aliado à direita que se virá a institucionalizar o processo contra-revolucionário
A verdade é que, após o golpe do 25 de Novembro, a rápida tomada de consciência dos militares democratas dos riscos que a democracia corria, nomeadamente aqueles que tendo combatido a Esquerda militar não se identificavam com a direita reaccionária, percebendo também que os sectores mais reaccionários que se tinham aliado ao Grupo dos Nove pretendiam agora ultrapassá-lo pela direita, conduziu à sua reorganização e à criação de uma nova linha de defesa da democracia, designadamente no seio das Forças Armadas e impediu que o 25 de Novembro liquidasse a revolução portuguesa e as suas conquistas.
Foram significativas as afirmações de Melo Antunes, no dia 26 de Novembro, de que «a participação do PCP na construção do socialismo era indispensável», e de Ramalho Eanes, em 6 de Dezembro, na sua tomada de posse como Chefe de Estado-Maior do Exército, quando declarou como «objectivos políticos prioritários a independência nacional e a construção de uma nova sociedade democrática e socialista» (JN, 7/12/75).
Aliás, exemplo de que o 25 de Novembro não pôs fim ao processo iniciado em 25 de Abril, como pretendem os esquerdistas, foi a aprovação e a entrada em vigor da Constituição da República e a institucionalização da democracia, cujo maior mérito foi, como sublinhou Álvaro Cunhal em A Revolução Portuguesa o Passado e o Futuro, «traduzir, não apenas, o resultado dos trabalhos da Constituinte, mas o resultado da luta do povo português e de todas as forças revolucionárias».
Daí que a nossa Constituição ainda hoje, apesar de amputada pelas sucessivas revisões constitucionais promovidas pelo PS e PSD, continue a manter conteúdos profundamente progressistas, e, por isso, a ser o alvo preferencial dos partidos da politica de direita no sentido da sua revisão, procurando retirar princípios e valores que ela encerra e atentar contra os direitos nela inscritos, com o supremo objectivo de consumar a reconfiguração do Estado ao serviço dos interesses do grande capital nacional e estrangeiro.

Assalto à Embaixada de Espanha

Das várias provocações montadas neste período, com o objectivo de responsabilizar os comunistas e o movimento operário e contra eles atear a ira popular, o assalto à Embaixada de Espanha é profundamente ilustrativo:
«Em fins de Setembro de 1975, a CIA, desencadeia um golpe magistralmente planeado e quase rigorosamente executado.
Cinco agentes da CIA, latino-americanos serão os executantes detonadores do assalto à Embaixada de Espanha em Lisboa. O assassínio previsto de cinco presos pelo garrote, facultaria o ambiente emocional para o efeito e a inconsciência habitual dos grupos esquerdistas completada pelo intencional voluntariado dos outros reaccionários camuflados de pseudo-esquerdistas, completarão o elenco necessário para o golpe que previa o assassinato do próprio embaixador de Espanha. Acidentalmente, ou talvez não, Edward Astwick Proctor, Conselheiro da Embaixada Americana, desconhecedor deste maquiavélico plano da CIA que incluía o assassínio daquele diplomata de quem é amigo pessoal, telefonar-lhe-á para não estar presente nesse dia na Embaixada, traduzindo, de qualquer forma, suspeitas que evitarão tão ingnominioso acto – que seria imputado, como é hábito nestas ocasiões, à Esquerda em geral. Prudente, o Embaixador acatar-lhe-ia a sugestão, o que muito provavelmente lhe terá salvo a vida.
A UDP cairá nesta armadilha e emprestar-lhe-á a sua cor política.»
Diniz de Almeida, Ascensão, Apogeu e Queda do MFA, II volume

Terrorismo: a cruz dos comunistas

A violência e o terrorismo foram uma arma importante das forças reaccionárias para dar combate aos democratas e às forças mais consequentes na defesa do 25 de Abril e das suas conquistas, com particular destaque para o PCP, os seus centros de trabalho e militantes, como podemos também constatar através de excertos do insuspeito livro O Segredo do 25 de Novembro, de José Freire Antunes (antigo deputado do PSD e adjunto político de Cavaco Silva entre 1988 e 1993).
«O incêndio e a perseguição tornaram-se pão nosso de cada dia. Multidões em fúria tomavam de assalto as sedes do Partido Comunista e de outros partidos de esquerda. O comunismo é a oitava praga.
A violência assenta arraiais no Minho. Nos primeiros dias de Agosto, só num raio de 20 quilómetros, e em três dias, foram destruídas sete sedes partidárias, incendiados e pilhados quatro escritórios, mortas duas pessoas e feridas dezenas.
Na Póvoa do Lanhoso, em S. João da Madeira, em Santo Tirso, em Fafe, em Cantanhede, em Vila Nova de Famalicão, a cruzada tem o mesmo nome do fogo posto.
Em certas localidades, em dias de assalto, ouve-se falar espanhol e brasileiro. Vêem-se também camionetas com forasteiros de ar profissional. São mercenários do ódio, pagos pelos ricos.
Os sinos tocam a rebate em muitas aldeias. Nos dias de feira, ou depois da missa, activistas calcorreiam as ruas.
“Morte aos comunistas que nos querem roubar os filhos.”
As bandeiras do PCP são queimadas e hasteadas em seu lugar as nacionais.
Na povoação de Amor, um centro cultural é assaltado por camponeses munidos de “forquilhas, enxadas, ferros e paus”. Um soldado da GNR está ali para manter a “ordem”: acaba por ser o capitão do assalto.
Os padres deixam correr o que julgam ser a execução de divinos propósitos. Nuns casos são cúmplices, noutros meros observadores.
Há mãos clandestinas a atear esta fogueira.
Nas águas turvas do descontentamento pescam o MDLP e o ELP. Frotas de exilados, com estímulos da direita europeia, fazem a sua “cruzada branca” contra a “opressão vermelha”.
Ensinam a fabricar coktails molotov nos seus panfletos. Querem transformar Lisboa numa “cidade-mártir”. Ateiam incêndios, põem bombas, matam comunistas, conspiram nos seminários e nas sacristias. Pagam a marginais e antigos quadros do Exército.
O CDS e o PPD são a capa legal desses núcleos. Mais eficazmente, porém, o catolicismo é o cimento ideológico dessa voragem.
A Igreja é a grande triunfadora deste ardente Verão. É certamente para brindar a essa vitória que Frank Carlucci, o dinâmico embaixador dos Estados Unidos, vai fazer a volta dos bispos. De 3 a 6 de Novembro, encontra-se com os bispos de Viseu, Vila Real, Braga.
A obra estava a sair asseada.
Mas não estava completa.»

A tese do «contra-golpe»

Os autores e os cúmplices das várias tentativas e golpes contra-revolucionários pós-25 de Abril (golpe Palma Carlos, 28 de Setembro e 11 de Março) procuraram sempre justificar as suas acções como sendo respostas a tentativas ou golpes do PCP. O 25 de Novembro não foi excepção. Para uns foi um golpe do PCP, e para outros um golpe animado pela Esquerda militar, ou pela «ala gonçalvista» do MFA, mas em ambas as situações com o apoio do PCP.
Em A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril (A contra-revolução confessa-se) , Álvaro Cunhal explica: «Como a orientação e acção do PCP e os acontecimentos provassem que não tinha havido nem golpe nem tentativa de golpe do PCP, inventou-se a tese do "recuo" – a história de que o PCP, vendo que o seu golpe militar, já desencadeado, iria falhar, recuou e desistiu do golpe. Essa tese do "recuo do PCP" é condimentada com uma insultuosa afirmação de Mário Soares: que o PCP teria lançado o golpe, mas, vendo que ia ser derrotado, deixou no terreno os esquerdistas "abandonados pelo PC" à sua sorte e à repressão (Maria João Avillez, Soares. Ditadura e Revolução). Falsidade e calúnia retomada por Freitas do Amaral (O Antigo Regime e a Revolução).
Explique-se. Esta invencionice, como argumento, deturpa dois factos reais: Um, as orientações dadas pela Direcção do PCP na noite de 24 para 25 a algumas das suas organizações para não se deixarem arrastar em atitudes ou na participação em aventuras esquerdistas de confronto militar (casos do Forte de Almada e do RAL1). Outro, uma conversa telefónica na mesma noite de 24 para 25 entre o Presidente da República Costa Gomes e o secretário-geral do PCP, Álvaro Cunhal, em que este, tendo tomado a iniciativa do contacto, nos termos habituais da ligação institucional com a Presidência da República, comunicou ao Presidente, desmentindo especulações em curso, que o PCP não estava envolvido em qualquer iniciativa de confronto militar e insistia em apontar a necessidade de uma solução política. Soares diz contudo que Costa Gomes conseguiu “convencer o Partido Comunista a desistir” do 25 de Novembro (entrevista ao Público-Magazine, 24-4-1994).»
A verdade dos factos e os testemunhos mais válidos (de Costa Gomes, de Melo Antunes, de Vasco Lourenço, de Ramalho Eanes) mostram que «indefensável» é a «tese» de Soares e seus amigos quando insistem no golpe do PCP e no contra-golpe de 25 de Novembro.»
 


Sobre o 25 de Novembro de 1975

Os acontecimentos de 25 de Novembro de 1975 surgem na sequência do chamado «verão quente», da queda do V Governo Provisório e do afastamento do general Vasco Gonçalves dos cargos e estruturas superiores das Forças Armadas e do Movimento das Forças Armadas (MFA), objectivo há muito perseguido pelas forças de direita e da social-democracia, sob a batuta da direcção do PS, do Grupo dos Nove e de sectores esquerdistas agrupados em torno de Otelo Saraiva de Carvalho, ao mesmo tempo que com a política de saneamentos à esquerda a Esquerda militar perdia posições importantes nos centros de decisão político-militar.
Os acontecimentos de 25 de Novembro de 1975 surgem na sequência do chamado «verão quente», da queda do V Governo Provisório e do afastamento do general Vasco Gonçalves dos cargos e estruturas superiores das Forças Armadas e do Movimento das Forças Armadas (MFA), objectivo há muito perseguido pelas forças de direita e da social-democracia, sob a batuta da direcção do PS, do Grupo dos Nove e de sectores esquerdistas agrupados em torno de Otelo Saraiva de Carvalho, ao mesmo tempo que com a política de saneamentos à esquerda a Esquerda militar perdia posições importantes nos centros de decisão político-militar.
O agravamento da crise político-militar e a ofensiva contra-revolucionária correm em paralelo, com lugar de destaque para o terrorismo bombista, que conta com a activa participação de militares e políticos e onde se destacam organizações como o MDLP-Movimento Democrático de Libertação de Portugal, inspirado e chefiado por Spínola, e o ELP-Exército de Libertação de Portugal. Organizações terroristas, contra-revolucionárias e anti-comunistas, que actuavam a partir do estrangeiro, nomeadamente do Brasil e da Espanha.
Uma crise que se agrava também à medida que se aproxima a data da independência de Angola, a 11 de Novembro. O processo de descolonização surge também na primeira linha da luta política em Portugal entre as forças revolucionárias e as contra-revolucionárias que, neste caso concreto, procuram impedir a concretização da independência na data aprazada e a consequente transferência do poder para um governo do MPLA. Uma batalha que perderam, conseguindo no entanto, com o empenhamento de Mário Soares e de Sá Carneiro, impedir que o Governo português reconhecesse no momento próprio (o que só aconteceria meses depois) a independência de Angola e o seu governo. Aliás, o PCP foi o único partido presente no acto de independência. Tudo isto, na expectativa que as tropas que invadiram Angola, a partir da África do Sul e do Zaire, conseguissem entrar em Luanda a tempo de impedir a proclamação da independência.
O 25 de Novembro, ao contrário do que muitos dos seus protagonistas disseram e escreveram e alguns continuam a insinuar, não foi um golpe promovido pelo PCP, pela Esquerda militar ou pela «ala gonçalvista» do MFA mas sim um golpe militar contra-revolucionário, fruto de uma cuidada e longa preparação, no quadro de um tumultuoso processo de rearrumação de forças no plano político e militar. É isso, aliás, que nos relata uma figura destacada da conspiração, José Gomes Mota, em A Resistência. O verão quente de 1975: «Para a elaboração desse plano criaram-se, inicialmente, dois grupos de trabalho, um político e outro militar, definindo-se-lhes prioritariamente as seguintes tarefas:
O grupo político, constituído basicamente pelos Conselheiros da Revolução teria de definir as acções a empreender pelo Movimento a todos os níveis dos órgãos de associativismo militar, com especial relevo para o Conselho da Revolução, Assembleias do MFA e Assembleias dos ramos e articular a sua acção, sem hipotecas ou comprometimentos, com a dos partidos que “guerreavam” aberta e energicamente os dissidentes.
O grupo militar, inicialmente constituído por Ramalho Eanes, Garcia dos Santos, Vasco Rocha Vieira, Loureiro dos Santos, Tomé Pinto e José Manuel Barroso tinha como tarefas fundamentais a eficiência da componente militar do Movimento e a elaboração de um plano de operações para o caso de qualquer confronto armado com os dissidentes.»
Como refere ainda o mesmo autor, o grupo político «veio a desempenhar o papel de um verdadeiro estado-maior de Vasco Lourenço», que era, de facto, o líder do Movimento, enquanto Ramalho Eanes liderava o grupo militar e se assumia como comandante operacional do Movimento.
Na preparação do golpe participaram forças muito diversas associadas num complexo processo de alianças contraditórias mas unidas em torno de um objectivo comum, como sublinha Álvaro Cunhal em A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril (A contra-revolução confessa-se) : «Todas estavam aliadas para pôr fim à influência do PCP e ao processo revolucionário, restabelecer uma hierarquia e disciplina nas forças armadas e extinguir o MFA insanavelmente em vias de destruição pelas suas divisões e confrontos internos. Mas, como resultado do golpe relativamente ao poder político e às medidas concretas a tomar, havia importantes diferenças.
Na grande aliança contra-revolucionária, internamente muito fragmentada, participavam fascistas declarados e outros reaccionários radicais, que visavam a instauração de uma nova ditadura, que tomasse violentas medidas de repressão, nomeadamente a ilegalização e destruição do PCP. Participava também o Grupo dos Nove, de que alguns membros, receosos da possibilidade de saírem vitoriosas do golpe as forças mais reaccionárias, pretendiam a continuação do regime democrático».
Uma aliança contra-revolucionária que contou com o importante contributo de Mário Soares e do PS. Por seu lado, o PCP teve uma acção incansável, expressa em intervenções do seu Secretário-geral, comunicados da Comissão Política e em variados documentos incluindo no próprio jornal «Avante!», no sentido de uma saída política para a crise propondo e concretizando encontros com todos os sectores, do PS (que recusou) aos agrupamentos esquerdistas, da Esquerda militar ao Grupo dos Nove e a militares esquerdistas ligados ao COPCON, embora sem resultados práticos.
«Em Outubro, quando se tornou evidente, por um lado, que se preparava um golpe militar contra-revolucionário, e, por outro lado, que se multiplicavam divisões, conflitos, fracturas, rupturas, revoltas e insubordinações nas forças armadas, o PCP intensificou a sua acção em quatro direcções.
Primeira, insistindo, em declarações públicas e na sua actividade, na necessidade de uma solução política.
Segunda, insistindo também em que qualquer tentativa da Esquerda ou de esquerdistas de um confronto e de uma solução militar seria, na correlação de forças existente, uma aventura condenada à derrota e podendo conduzir a uma feroz repressão.
Terceira, multiplicando os contactos com os diversos sectores militares e políticos com vistas a uma solução comummente acordada a fim de impedir que, de um golpe militar, resultasse uma ditadura da extrema direita, o que se tornava um perigo real pela composição da “grande aliança” que estava preparando o golpe.
A quarta, continuando a desenvolver as acções de massas.» [Álvaro Cunhal – A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril (A contra-revolução confessa-se)] .
O golpe do 25 de Novembro significou a criação de uma nova situação política, uma viragem à direita na vida nacional, mas os mais ambiciosos objectivos contra-revolucionários foram derrotados. A poderosa dinâmica do movimento operário e popular e o prestígio e intervenção esclarecida do Partido foram factores determinantes para a contenção do golpe. Em lugar de reprimido e ilegalizado, o PCP continuou no Governo e a reforçar-se no plano orgânico e da sua influência social e política. Será com a formação do primeiro governo constitucional do PS sozinho mas de facto aliado à direita que se virá a institucionalizar o processo contra-revolucionário
A verdade é que, após o golpe do 25 de Novembro, a rápida tomada de consciência dos militares democratas dos riscos que a democracia corria, nomeadamente aqueles que tendo combatido a Esquerda militar não se identificavam com a direita reaccionária, percebendo também que os sectores mais reaccionários que se tinham aliado ao Grupo dos Nove pretendiam agora ultrapassá-lo pela direita, conduziu à sua reorganização e à criação de uma nova linha de defesa da democracia, designadamente no seio das Forças Armadas e impediu que o 25 de Novembro liquidasse a revolução portuguesa e as suas conquistas.
Foram significativas as afirmações de Melo Antunes, no dia 26 de Novembro, de que «a participação do PCP na construção do socialismo era indispensável», e de Ramalho Eanes, em 6 de Dezembro, na sua tomada de posse como Chefe de Estado-Maior do Exército, quando declarou como «objectivos políticos prioritários a independência nacional e a construção de uma nova sociedade democrática e socialista» (JN, 7/12/75).
Aliás, exemplo de que o 25 de Novembro não pôs fim ao processo iniciado em 25 de Abril, como pretendem os esquerdistas, foi a aprovação e a entrada em vigor da Constituição da República e a institucionalização da democracia, cujo maior mérito foi, como sublinhou Álvaro Cunhal em A Revolução Portuguesa o Passado e o Futuro, «traduzir, não apenas, o resultado dos trabalhos da Constituinte, mas o resultado da luta do povo português e de todas as forças revolucionárias».
Daí que a nossa Constituição ainda hoje, apesar de amputada pelas sucessivas revisões constitucionais promovidas pelo PS e PSD, continue a manter conteúdos profundamente progressistas, e, por isso, a ser o alvo preferencial dos partidos da politica de direita no sentido da sua revisão, procurando retirar princípios e valores que ela encerra e atentar contra os direitos nela inscritos, com o supremo objectivo de consumar a reconfiguração do Estado ao serviço dos interesses do grande capital nacional e estrangeiro.

Assalto à Embaixada de Espanha

Das várias provocações montadas neste período, com o objectivo de responsabilizar os comunistas e o movimento operário e contra eles atear a ira popular, o assalto à Embaixada de Espanha é profundamente ilustrativo:
«Em fins de Setembro de 1975, a CIA, desencadeia um golpe magistralmente planeado e quase rigorosamente executado.
Cinco agentes da CIA, latino-americanos serão os executantes detonadores do assalto à Embaixada de Espanha em Lisboa. O assassínio previsto de cinco presos pelo garrote, facultaria o ambiente emocional para o efeito e a inconsciência habitual dos grupos esquerdistas completada pelo intencional voluntariado dos outros reaccionários camuflados de pseudo-esquerdistas, completarão o elenco necessário para o golpe que previa o assassinato do próprio embaixador de Espanha. Acidentalmente, ou talvez não, Edward Astwick Proctor, Conselheiro da Embaixada Americana, desconhecedor deste maquiavélico plano da CIA que incluía o assassínio daquele diplomata de quem é amigo pessoal, telefonar-lhe-á para não estar presente nesse dia na Embaixada, traduzindo, de qualquer forma, suspeitas que evitarão tão ingnominioso acto – que seria imputado, como é hábito nestas ocasiões, à Esquerda em geral. Prudente, o Embaixador acatar-lhe-ia a sugestão, o que muito provavelmente lhe terá salvo a vida.
A UDP cairá nesta armadilha e emprestar-lhe-á a sua cor política.»
Diniz de Almeida, Ascensão, Apogeu e Queda do MFA, II volume

Terrorismo: a cruz dos comunistas

A violência e o terrorismo foram uma arma importante das forças reaccionárias para dar combate aos democratas e às forças mais consequentes na defesa do 25 de Abril e das suas conquistas, com particular destaque para o PCP, os seus centros de trabalho e militantes, como podemos também constatar através de excertos do insuspeito livro O Segredo do 25 de Novembro, de José Freire Antunes (antigo deputado do PSD e adjunto político de Cavaco Silva entre 1988 e 1993).
«O incêndio e a perseguição tornaram-se pão nosso de cada dia. Multidões em fúria tomavam de assalto as sedes do Partido Comunista e de outros partidos de esquerda. O comunismo é a oitava praga.
A violência assenta arraiais no Minho. Nos primeiros dias de Agosto, só num raio de 20 quilómetros, e em três dias, foram destruídas sete sedes partidárias, incendiados e pilhados quatro escritórios, mortas duas pessoas e feridas dezenas.
Na Póvoa do Lanhoso, em S. João da Madeira, em Santo Tirso, em Fafe, em Cantanhede, em Vila Nova de Famalicão, a cruzada tem o mesmo nome do fogo posto.
Em certas localidades, em dias de assalto, ouve-se falar espanhol e brasileiro. Vêem-se também camionetas com forasteiros de ar profissional. São mercenários do ódio, pagos pelos ricos.
Os sinos tocam a rebate em muitas aldeias. Nos dias de feira, ou depois da missa, activistas calcorreiam as ruas.
“Morte aos comunistas que nos querem roubar os filhos.”
As bandeiras do PCP são queimadas e hasteadas em seu lugar as nacionais.
Na povoação de Amor, um centro cultural é assaltado por camponeses munidos de “forquilhas, enxadas, ferros e paus”. Um soldado da GNR está ali para manter a “ordem”: acaba por ser o capitão do assalto.
Os padres deixam correr o que julgam ser a execução de divinos propósitos. Nuns casos são cúmplices, noutros meros observadores.
Há mãos clandestinas a atear esta fogueira.
Nas águas turvas do descontentamento pescam o MDLP e o ELP. Frotas de exilados, com estímulos da direita europeia, fazem a sua “cruzada branca” contra a “opressão vermelha”.
Ensinam a fabricar coktails molotov nos seus panfletos. Querem transformar Lisboa numa “cidade-mártir”. Ateiam incêndios, põem bombas, matam comunistas, conspiram nos seminários e nas sacristias. Pagam a marginais e antigos quadros do Exército.
O CDS e o PPD são a capa legal desses núcleos. Mais eficazmente, porém, o catolicismo é o cimento ideológico dessa voragem.
A Igreja é a grande triunfadora deste ardente Verão. É certamente para brindar a essa vitória que Frank Carlucci, o dinâmico embaixador dos Estados Unidos, vai fazer a volta dos bispos. De 3 a 6 de Novembro, encontra-se com os bispos de Viseu, Vila Real, Braga.
A obra estava a sair asseada.
Mas não estava completa.»

A tese do «contra-golpe»

Os autores e os cúmplices das várias tentativas e golpes contra-revolucionários pós-25 de Abril (golpe Palma Carlos, 28 de Setembro e 11 de Março) procuraram sempre justificar as suas acções como sendo respostas a tentativas ou golpes do PCP. O 25 de Novembro não foi excepção. Para uns foi um golpe do PCP, e para outros um golpe animado pela Esquerda militar, ou pela «ala gonçalvista» do MFA, mas em ambas as situações com o apoio do PCP.
Em A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril (A contra-revolução confessa-se) , Álvaro Cunhal explica: «Como a orientação e acção do PCP e os acontecimentos provassem que não tinha havido nem golpe nem tentativa de golpe do PCP, inventou-se a tese do "recuo" – a história de que o PCP, vendo que o seu golpe militar, já desencadeado, iria falhar, recuou e desistiu do golpe. Essa tese do "recuo do PCP" é condimentada com uma insultuosa afirmação de Mário Soares: que o PCP teria lançado o golpe, mas, vendo que ia ser derrotado, deixou no terreno os esquerdistas "abandonados pelo PC" à sua sorte e à repressão (Maria João Avillez, Soares. Ditadura e Revolução). Falsidade e calúnia retomada por Freitas do Amaral (O Antigo Regime e a Revolução).
Explique-se. Esta invencionice, como argumento, deturpa dois factos reais: Um, as orientações dadas pela Direcção do PCP na noite de 24 para 25 a algumas das suas organizações para não se deixarem arrastar em atitudes ou na participação em aventuras esquerdistas de confronto militar (casos do Forte de Almada e do RAL1). Outro, uma conversa telefónica na mesma noite de 24 para 25 entre o Presidente da República Costa Gomes e o secretário-geral do PCP, Álvaro Cunhal, em que este, tendo tomado a iniciativa do contacto, nos termos habituais da ligação institucional com a Presidência da República, comunicou ao Presidente, desmentindo especulações em curso, que o PCP não estava envolvido em qualquer iniciativa de confronto militar e insistia em apontar a necessidade de uma solução política. Soares diz contudo que Costa Gomes conseguiu “convencer o Partido Comunista a desistir” do 25 de Novembro (entrevista ao Público-Magazine, 24-4-1994).»
A verdade dos factos e os testemunhos mais válidos (de Costa Gomes, de Melo Antunes, de Vasco Lourenço, de Ramalho Eanes) mostram que «indefensável» é a «tese» de Soares e seus amigos quando insistem no golpe do PCP e no contra-golpe de 25 de Novembro.»
 
 
 

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