PROBLEMAS ECONÓMICOS DO SOCIALISMO NA URSS
José Estaline
Publicações
Nova Aurora
Lisboa 1975
Páginas: 108
Dimensões:205x146x06
Exemplar em bom
estado, capa e contracapa com pequenas dobras.
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Preço 11.00€
Sobre
o tema
"Problemas económicos do socialismo na
URSS", o autor e a obra
1ª Parte, o autor
por Daniel Vaz
de Carvalho
//resistir.info
"Problemas
económicos do socialismo na URSS" [1] foi escrito
por Joseph Vissarionovitch Estaline em 1952. Vale a pena recordar este texto
não só como documento histórico, de certo modo inserido nos 100 anos da
Revolução Socialista de Outubro, mas também pelo que pode ter de relevância
atual quanto à análise e definição de critérios e políticas do socialismo.
Antes de fazermos uma breve resenha do texto, algumas notas sobre o autor, tema
tabu, cujas abordagens ou são ignoradas ou quase consideradas uma apologia do
crime. Porém, como disse Espinosa: "Trabalhei cuidadosamente para não
escarnecer, nem lamentar, nem execrar, mas apenas compreender as ações
humanas".
De qualquer forma, o texto e o seu autor merecem alguma reflexão e ganham uma
perspetiva que não deve passar despercebida. Afinal a Revolução não acabou ao
fim dos 10 dias que abalaram o mundo, prosseguiu durante décadas, só pôde ser
destruída pela traição e contrariamente à vontade expressa do seu povo. Lembrar
o imenso contributo da Revolução para o progresso dos trabalhadores e dos povos
é também lembrar os seus obreiros e os seus líderes, os seus êxitos, erros e
circunstâncias.
A propósito do autor
Falar do autor é extremamente problemático. A luta ideológica contra o
socialismo impôs-se de forma tão intensa que mesmo em sectores avançados ideologicamente
se estabeleceu a autocensura. Historiadores que se apresentam como gente séria
vão ao ponto de considerar Estaline um criminoso pior que Hitler de tal modo a
repetida falsificação condiciona o pensamento.
E no entanto as coisas de forma alguma se passaram como divulgam. Além de que
os pretensos acusadores perdem a autoridade moral para o fazer quando
sistematicamente defendem, omitem ou justificam os crimes cometidos sob o
capitalismo.
No Pequeno Dicionário Filosófico, edição de 1959, publicado em Moscovo, (já com
Khruchov na liderança) Estaline é considerado "destacado dirigente do
movimento trabalhista revolucionário russo e internacional", "notável
revolucionário proletário" que após a "morte de Lenine conduziu firme
e decididamente o povo soviético pelo caminho da construção do socialismo. Nas
suas obras teóricas desenvolveu de maneira admirável a teoria
marxista-leninista". Contudo "na sua ação cometeu sérios erros".
"Certas limitações da democracia interna inevitáveis nas condições de luta
encarniçada contra o inimigo de classe e mais tarde contra os invasores germano
fascistas começaram a ser transformados em norma violando grosseiramente os
princípios leninistas". "Foram cometidas arbitrariedades e abusos de
poder e graves violações da legalidade socialista". Apesar disto "o
Partido Comunista e o povo soviético recordarão sempre Estaline e lhe farão
justiça". "A cruzada dos círculos reacionários imperialistas contra o
chamado "estalinismo", por eles inventado, é na realidade uma cruzada
contra o movimento operário revolucionário e na sua essência uma forma de luta
conta as teses básicas do marxismo-leninismo". (pág. 542 a 545)
Em termos gerais, a súmula do Dicionário pode aceitar-se como correta. Na
realidade o frenesim contra o sucessor de Lenine generaliza-se a partir do fim
dos anos 80, com Gorbatchov e Ieltsin, em que a falsidade atingiu formas
grotescas que o imperialismo em vários casos retomou da propaganda nazi
servindo de esteio para a destruição da URSS. Brejniev pretendeu em 1969 a
"reabilitação" de Estaline, porém tal só foi possível parcialmente
devido a oposição na Comissão Política.
O culto da personalidade
O culto da personalidade existiu. Era inevitável naquelas condições concretas.
As exigentes tarefas de reconstrução do país e de preparação para a agressão,
inscrita nos objetivos do capitalismo internacional, exigiam para as massas não
apenas noções ideológicas, mas que seguissem um líder que admiravam e em quem
confiavam.
Até que ponto esse culto foi fomentado pelo seu protagonista não é claro. No
fim da II Guerra Mundial recusou receber a condecoração de Herói da União
Soviética: "se não estive na frente de batalha, que espécie de herói
sou?" [2]
Quando em 1946 lhe foi apresentada uma sua biografia feita por um coletivo,
Estaline recusa-a: "Diz-se que sou o autor de todos os ensinamentos,
sublinha-se que criei a teoria sobre o comunismo, como se Lenine só tivesse
escrito e falado sobre o socialismo e nunca sobre o comunismo. Mais, os
ensinamentos sobre a industrialização do país e a colectivização da agricultura
são apresentados como se fossem meus. Na verdade, pertence a Lenine o mérito de
ter colocado o problema da industrialização do nosso país. Isto também é válido
para a questão da colectivização da agricultura, etc. Há nesta biografia muita
adulação e exagero do papel da personalidade. Que deve fazer o leitor depois de
ler esta biografia? Ajoelhar-se e adorar-me? Assim não se educam as pessoas no
espírito do marxismo. Não precisamos de veneradores de ídolos". "As
pessoas não devem ser educadas para serem escravos, mas há entre vós essa
tendência. Vós não educais as pessoas no amor ao Partido. Quando eu já não
existir, que sucederá então?" "Quadros bolcheviques como Dzerjinski,
Frunze e Kuibichev também viveram e agiram, mas sobre eles nada se escreve, são
omitidos." [3]
Na obra em epígrafe escrita quando contava 72 anos e quase 30 na liderança, são
muitas as citações de Marx, Engels, Lenine, mas só se cita duas vezes, porém
para se autocriticar e propõe que se retire do Manual o capítulo "A
criação da economia política do socialismo por V.I. Lenine e I.V. Estaline"
"É completamente desnecessário porque não acrescenta nada de novo e é uma
pobre repetição do que está dito nos capítulos anteriores". (pág. 323)
Perante a sugestão de um economista que se propõe "desenvolver as soluções
teóricas da teoria marxista, leninista-estalinista da economia política do
socialismo", Estaline considera a ideia ridícula. (pág. 336)
No Pravda (08/maio/1947) escreveu: "Lenine é o nosso mestre e nós,
soviéticos, somos discípulos de Lenine. Nunca nos desviámos da sua herança e
nunca nos desviaremos dela". [4]
A repressão
Os números são conhecidos mas omitidos. Os arquivos soviéticos investigados
após o fim da URSS pela comissão Zemstov [5] mostraram
o seguinte: entre 1921 e 1953 foram "reprimidas" cerca de quatro
milhões de pessoas. Dentre elas, efetivamente condenadas à morte 799 455.
Em 1953 havia 2 468 524 presos soviéticos, incluindo presos comuns,
apresentados pelos falsificadores da história como políticos, contudo apenas
18,8% daquele total eram considerados "contrarrevolucionários". O
tempo de condenação para a maioria dos prisioneiros, era no máximo de cinco
anos. [6] Aliás o
número total de presos era semelhante aos dos EUA atualmente (2 milhões).
Sendo decididamente contra a pena de morte aquele número não é aceitável. Todas
as críticas e reabilitações não restituíram a vida aos inocentes. Por muitos
erros que Kruschov tenha cometido – e foram muitos – uma virtude teve: parou
com estes métodos, embora abrindo as portas ao oportunismo.
É certo que foi preciso fazer frente, à sabotagem, a conspirações, mas também à
corrupção, ao abuso de poder, à criminalidade. Houve ainda duas guerras: a dita
"civil" – intervenção das potências capitalistas – e a agressão
nazi-fascista, com um horroroso balanço de crimes e mesmo colaboração com o
inimigo em certas zonas. Dados que nunca se contabilizam. Tudo isto existia
para além do "realismo socialista", forma de estímulo e educação das
massas trabalhadoras
Versões absurdas postas a circular falam em 12 milhões de presos e afirma-se
que 50 ou 60 milhões haviam sido vítimas da repressão, da colectivização, da
fome, etc. Para Soljenítsine (um fascista admirador de Franco e Pinochet, que
após 1974 defendeu a intervenção dos EUA em Portugal e que lamentava a
libertação das colónias portuguesas [6] ) entre
1917 e 1959 o "comunismo" havia matado 110 milhões de pessoas…
A realidade é que a população do país continuou a aumentar mais de 1% ao ano,
superando o crescimento demográfico de Inglaterra ou França. Em 1926 a URSS
tinha 147 milhões de habitantes, em 1937, 162 milhões e em 1939, 170,5 milhões.
[7]
A repressão sobre os kulaks não foi um delírio de ódio de classe. A política inicial
era de colaboração considerando-se que as medidas económicas seriam suficientes
para os levar a participarem no socialismo. "O kulak tem de ser travado
através de medidas económicas e com base na legalidade soviética. E a lei não é
letra morta. Isto não exclui naturalmente a aplicação de algumas medidas
administrativas necessárias contra os kulakes. Mas as medidas administrativas
não devem substituir as medidas de ordem económica" [8]
Acabou por ser uma necessidade absoluta para que os habitantes das cidades não
perecessem: os kulaks procediam ao açambarcamento da produção agrícola, matavam
e enterravam o gado para não o entregarem às cooperativas, provocavam a penúria
e o mercado negro. Podemos avaliar o que sucederia à URSS se estas medidas não
fossem tomadas, pelo modo como o imperialismo e as direitas internas têm atuado
na desestabilização da Venezuela.
O suposto genocídio na Ucrânia, que a investigação de Zemstsov desmente, teve
origem numa campanha de Goebbels como preparação para a sua
"libertação" pelas tropas nazis. Retomada na atualidade a versão
Goebbels é preferida à soviética. (Mario Sousa)
É um facto que o debate com os oposicionistas existiu durante mais de 15 anos,
antes de lhes serem aplicadas medidas repressivas. Todos os principais
dirigentes alvo de críticas e expulsos do Partido, foram de novo reconduzidos
nos cargos antes de em 1937-38 serem acusados de optaram pela subversão e
colaboração com potências estrangeiras, julgados e em certos casos condenados à
morte.
Kaganovitch conta que relativamente aos oposicionistas no final dos anos 20
Estaline considerava que: "não nos devemos precipitar. Primeiro porque
havia sempre a possibilidade daqueles elementos poderem evoluir para posições
sensatas, evitando que tivéssemos de recorrer à medida extrema – a expulsão do
Partido – e, segundo, porque nesse caso o Partido teria de compreender primeiro
a necessidade da sua expulsão e do seu isolamento" [9]
As chamadas "purgas" não foram um episódio de paranoia e ambição de
poder. Constituíram processos destinados a corrigir faltas na disciplina e nos
deveres dos membros do Partido, como abuso de autoridade, nepotismo, corrupção.
Além disto, perante os perigos que ameaçavam o país, era necessária uma efetiva
disciplina para todos os membros do Partido. Cada elemento visado podia
recorrer sendo os casos revistos e dando-lhes razão.
O trabalho da NKVD foi criticado em 1938: "prenderam 52.372 pessoas ao
abrigo das disposições legais sobre os crimes contra-revolucionários. No
julgamento destes processos pelos órgãos judiciais foram condenadas 2.731
pessoas, das quais foram fuziladas 89 pessoas, e absolvidas 49.641 pessoas. Um
tão elevado número de absolvições confirmou que o então comissário do Povo do
NKVD, Ejov, prendeu muitas pessoas sem fundamento suficiente. Nas costas do CC,
cometeu arbitrariedades". [9] Ejov foi
fuzilado...
Numa intervenção em maio de 1941 Estaline critica Vorochilov pelas suas
"medidas excessivas" na depuração das Forças Armadas, tendo já então
sido reintegrada a maioria. Comentando os exageros que se verificaram neste
processo, Stáline afirmou em Maio de 1948: "Podemos naturalmente
compreender o camarada Voroschilov. Baixar a vigilância é algo de extremamente
perigoso, já que, para lançar uma ofensiva na Frente são necessárias centenas
de milhares de soldados, mas para provocar o seu fracasso bastam dois ou três
canalhas traidores no Estado-Maior. No entanto, apesar de todas as
justificações, a destituição de 40 mil comandantes das forças armadas foi uma
iniciativa não só excessiva, como também extremamente prejudicial em todos os
sentidos. O Comité Central do Partido corrigiu a atuação do camarada
Voroschilov." [9]
Na realidade, o que a propaganda afirmou ser o "aniquilamento de 40 mil
comandantes e comissários políticos entre 1937-40" resumiu-se à
destituição de 36.898 de membros do corpo de oficiais, por condições de idade
ou saúde, violações disciplinares, delitos morais e falta de confiança
política. Ao todo foram presos 9 579 oficiais. "Legitimamente, muitos dos
destituídos e presos contestaram os respectivos processos. As suas reclamações
foram analisadas por uma Comissão criada para esse fim. Em resultado do trabalho
da Comissão, em 1 de Maio de 1940, foram reintegrados no Exército 12 461
comandantes, dos quais 10 700 tinham sido expulsos por razões políticas. O
reexame de cada caso em concreto conduziu à libertação de mais de 1.500 presos.
Em todo este processo, 70 pessoas foram condenadas à morte por
fuzilamento". [10]
A autoridade moral
Todas as mortes na URSS são atribuídas ao sistema. Mas então porque não
considerar como consequências do sistema capitalista os milhões que morreram
devido à depressão iniciada em 1929? Ou os 25 milhões de vítimas da "gripe
espanhola" a seguir à Grande Guerra em 1919?
O puritanismo crítico raramente tem autoridade moral; é antes um estratagema
dos promotores do fanatismo e da ignorância. As guerras dos EUA após o 11 de
setembro, em 14 anos, mataram pelo menos 2 milhões de pessoas nos países que
foram atacados, ocupados ou desestabilizados. [11]
Quantos apenas desde a segunda guerra mundial pelo colonialismo e
neocolonialismo? Na guerra da Coreia mais de 4 milhões, outro tanto ou mais no
Vietname, Laos, Cambodja (o criminoso Pol-Pot também foi apoiado pelo
Ocidente). Nos fascismos da Indonésia à Argentina, Chile, Bolívia, etc.
Quantos? Segundo André Vitchek 55 milhões de vidas perdidas em resultado do
colonialismo, neocolonialismo, invasões diretas, golpes de Estado e outros atos
de terrorismo internacional. Provavelmente um número subestimado atendendo aos
que morreram pela fome e absoluta miséria desencadeada pelo imperialismo. [12]
Por que são ignorados os relatórios sobre tortura praticada pelos EUA e as
prisões secretas da CIA? E a "Escola das Américas" que se assemelha
aos "castelos SS" de Himler, onde se preparavam polícias que nada
ficavam a dever à Gestapo de Goering e Muller? Será que isto não tem nada a ver
com o sistema capitalista? E as centenas de cidadãos mortos anualmente pela
polícia dos EUA, e as tragédias do crime organizado, nada têm a ver com o
sistema? E os 60 000 mortos por anos nos EUA devido a overdoses ?
Quem foi Estaline
Ele próprio responde ao seu filho: "Pensas que és Estaline? Pensas que eu
sou Estaline? Não, Estaline é aquele", diz apontando para o seu retrato na
parede. "Nós temos a obrigação de nos mantermos com os pés no chão e
cumprir com as tarefas que nos determina a nossa existência humana." [13]
Estaline foi e é desumanizado e diabolizado, como todos os que o imperialismo
na sua ambição quer destruir. Encarna a personagem de um herói de tragédia
grega: procura aproximar-se da visão idealizada pelo seu mestre, Lenine, mas
vê-se mergulhado no drama.
Em várias ocasiões mostrou ser decididamente contra medidas repressivas. A
prova disso é a resolução do plenário do CC em Janeiro de 1938, assim como a
resolução conjunta do Soviete dos Comissários do Povo da URSS e do CC do
PCU(b), de 17 de Novembro de 1938, "Sobre Prisões, Controlo da
Procuradoria e Condução das Investigações" assinada por Molotov e
Estaline. Mas naturalmente que os inocentes condenados à morte não
ressuscitaram por causa disso. [14]
K. Rokossovski, foi um dos oficiais investigados no processo de depuração das
Forças Armadas tendo estado preso. Foi reintegrado após reexame dos processos,
e mais tarde promovido a Marechal. Estaline perguntou-lhe certa vez:
"Ainda se sente humilhado por ter sofrido com as repressões e ter passado
algum tempo na prisão?". Rokossovski respondeu simplesmente: "Nunca
deixei de acreditar no Partido. Os tempos eram assim." Khruchov pediu-lhe
que interviesse contra Estaline. Rokossovski respondeu-lhe: "Nikita
Sergejevitch, para mim o camarada Estaline é sagrado!". Considerou aquelas
acusações contra desonrosas e pérfidas". [15]
Ivan Benediktov em 1936 diretor-geral no Ministério da Agricultura, conta ter
sido chamado ao NKVD. Um oficial mostra-lhe uma acusação de sabotagem subscrita
por três elementos do Partido, sobre os quais antes lhe foi pedida opinião.
"Tudo o que está aí é verdade, mas deve-se apenas à minha
inexperiência". O investigador diz-lhe então: "Recolhi algumas
informações sobre si e não são más: é uma pessoa empenhada, bastante capaz. (…)
quero que compreenda a nossa posição: admite que os factos tiveram lugar e diz
que não tem qualquer dúvida sobre a honestidade daqueles que o acusam de
sabotagem. Concordará que enquanto tchekistas temos que agir em conformidade.
Eu compreendo, agora está numa situação complicada, mas não vale a pena
desesperar porque ainda não chegámos a nenhuma conclusão - disse-me o
investigador na despedida, apertando-me a mão". O caso vai às mãos de
Estaline, mas este acaba por nomeá-lo ministro da Agricultura e assim
permaneceu até 1953. "Com outro a minha sorte talvez tivesse sido
diferente" – diz, considerando Estaline o mais "moderado" na
Comissão Política. [16]
Desde 1990 a popularidade de Estaline triplicou. Numa sondagem realizada em
março de 2017 na Rússia 54% consideraram a atitude de Estaline globalmente
positiva, 17% negativa.